Aumento da qualificação não é solução mágica; programas contra desemprego juvenil deveriam atuar para equilibrar oferta e demanda de empregos
Por Kartik Akileswaran, Jonathan Mazumdar e Angela Perez Albertos
Quando eu estava me preparando para vir para Déli trabalhar, todos na aldeia riram e perguntaram como era possível que eu encontrasse um emprego em uma cidade grande com a minha educação do vilarejo”, lembrou Tabassum Naaz, de 22 anos, em 2010. Eles provavelmente pensaram que suas credenciais seriam humildes demais No entanto, assim como milhares de outras pessoas em toda a Índia, a partir da década de 1990, Tabassum encontrou um emprego (no seu caso, na terceirização de processos empresariais Aegis em Gurgaon, nos arredores de Déli). Os seus estudos – numa faculdade pouco conhecida em Bihar, um dos estados de rendimentos mais baixos da Índia – foram suficientes simplesmente porque havia empregadores que procuravam trabalhadores com as suas competências.
Atualmente, muitos agentes do desenvolvimento internacional estão preocupados, e com razão, com o desemprego entre os jovens. Apesar de histórias de sucesso como a de Tabassum, a taxa continua alta nos países em desenvolvimento: em 2022, era de 24,8% no Oriente Médio e Norte da África (conhecida pela sigla Mena, Oriente Médio e Norte da África, no acrônimo em inglês), 20,5% na América Latina, 14,9% na Ásia e no Pacífico e 12,7% na África Subsaariana. Entretanto, as iniciativas nessa área tendem a se concentrar no lado da oferta de mão de obra, apoiando o desenvolvimento de habilidades e a educação. O Banco Mundial, por exemplo, investiu cerca de US$ 1 bilhão por ano entre 2002 e 2012 em programas de treinamento de habilidades voltados para os jovens. Uma busca por “desemprego juvenil” no site do Fórum Econômico Mundial revela um foco esmagador no desenvolvimento de habilidades: um relatório de 2010 lista a “qualidade e relevância da educação” como a primeira causa do desemprego entre os jovens; um artigo de 2016 pede programas de treinamento ou de preparação para o trabalho para lidar com o desemprego juvenil na América Latina; e um texto de 2020 sugere o ensino de inglês, habilidades interpessoais e digitais para resolver o desafio na região Mena.
Há muitos outros exemplos, A Mastercard Foundation, que tem como objetivo lidar com esse problema na África através da criação de 30 milhões de empregos, identifica “melhorar a qualidade da educação e do treinamento vocacional” e “alavancar a tecnologia para conectar empregadores e candidatos a emprego” como suas duas primeiras estratégias para possibilitar a criação de vagas. Uma análise de 75 programas de emprego para jovens na região Mena concentrou-se no treinamento de habilidades técnicas, seguido de soft skills.
A história de Tabassum sugere uma abordagem diferente. Ela representa um fenômeno comprovado por vários estudos: oportunidades de emprego impulsionam o nível de escolaridade. Nesse caso, as matrículas em educação (especialmente em escolas de inglês) de fato aumentaram perto dos novos centros de TI. Em outras palavras, em vez de a educação gerar bons empregos, foi o surgimento de “bons” empregos, que exigem certas habilidades, que incentivou os pais a investir na educação de seus filhos.
Mas, se a oferta de empregos impulsiona um aumento no nível de escolaridade, e não o contrário, isso sugere uma mudança de orientação para a comunidade de desenvolvimento. O enfrentamento do desemprego juvenil por meio da capacitação dos jovens com melhores habilidades certamente vale a pena por si só. Porém, se ele não for acompanhado de esforços para criar novos postos de trabalho, só desenvolver habilidades não vai resolver o desafio do desemprego.
Um problema de empregos
Nos países em desenvolvimento, o problema básico é que simplesmente não há empregos suficientes para os jovens que entram no mercado de trabalho todos os anos, uma incompatibilidade exacerbada pelas altas taxas de crescimento populacional na maioria dessas regiões.
A McKinsey estima que a África sozinha vai adicionar 796 milhões de pessoas à força de trabalho global entre 2020 e 2050, um aumento líquido de cerca de 27 milhões de pessoas por ano. Para o continente, isso significa o dobro de pessoas somadas à força de trabalho em comparação com os 30 anos anteriores.
Atualmente, de 10 a 12 milhões de jovens africanos entram na força de trabalho, mas só há 3 milhões de empregos formais disponíveis para eles. Isso significa que entre 7 e 9 milhões de novos jovens africanos não têm acesso a uma fonte de renda estável. É o equivalente à população da cidade de Nova York. Da mesma forma, a Índia vai adicionar 183 milhões de pessoas à força de trabalho global nesse mesmo período (cerca de 6 milhões por ano), e as estimativas sugerem que haverá cerca de 45 milhões de empregos em falta no país até 2030.
A educação não é uma solução mágica. Como ilustra a região Mena, o aumento do nível de escolaridade não leva necessariamente a melhores resultados no mercado de trabalho: em toda sua extensão, mesmo depois de décadas de aumento no nível de escolaridade, não houve aumento similar na participação da força de trabalho.
Por exemplo, uma expansão da educação terciária na Tunísia levou a taxas de desemprego de quase 70% entre os graduandos universitários em 2013. O Banco Mundial até apelidou esse fenômeno de “paradoxo da região Mena”, destacando uma redução nos empregos do setor público – ocupados na maior parte por trabalhadores instruídos – que não foi compensada por um aumento suficiente nos empregos do setor privado.
Anos de avaliações forneceram insights substanciais sobre o impacto das intervenções focadas na oferta e, infelizmente, as evidências não são nada animadoras. Uma análise de 2017 constatou que, para cada 100 pessoas que receberam treinamento vocacional, menos de 3 encontraram um emprego “adicional” (uma vaga que não teriam encontrado se não tivessem recebido o treinamento). Além disso, esses programas têm um custo muito alto: entre aproximadamente US$ 17 mil e US$ 60 mil por pessoa adicional empregada.
A mesma análise constatou que, dos dez programas que ajudam a combinar candidatos a vagas adequadas, apenas um teve um impacto significativo sobre o trabalho (um aumento de 2,4 pontos percentuais no emprego em três anos).
No entanto, é mais provável que essas intervenções sejam bem-sucedidas quando implementadas pelo setor privado ou associadas a iniciativas focadas na demanda, como o treinamento de talentos para um setor recém-criado. Como conclui o documento: “Políticas alternativas incluiriam se afastar das intervenções voltadas para a oferta de mão de obra e se concentrar mais em políticas para ajudar as empresas a superar os obstáculos que enfrentam para inovar, crescer e criar mais empregos.”
Entre exemplos de intervenções destinadas a aumentar a demanda de mão de obra, estariam o estímulo à entrada de novas empresas (impulsionando companhias pioneiras ou atraindo investimentos estrangeiros diretos em novos setores) ou a aceleração da produtividade e do crescimento das empresas existentes, limitando os encargos regulatórios ou apoiando-as em práticas de gestão e facilitação de exportação.
Pela abordagem focada na demanda
Em outro artigo recente, argumentamos que os filantropos do desenvolvimento deveriam se concentrar no caminho mais poderoso para a prosperidade: emprego produtivo em uma economia próspera. Uma maneira concreta pela qual a comunidade filantrópica pode fazer isso é colocando a criação de empregos no centro de seus programas de desemprego juvenil e garantir que as intervenções do lado da oferta e da demanda trabalhem em conjunto.
Algumas instituições filantrópicas já estão fazendo isso, embora com foco nos Estados Unidos. A Fundação Kauffman, por exemplo, apoia o estabelecimento e o crescimento de novas empresas que possam criar empregos e faz investimentos para melhorar a política de criação de vagas.
O Programa de Oportunidades Econômicas do Instituto Aspen é outro exemplo. Ele apoia iniciativas de reflexão e colaboração em torno da “boa” criação de empregos. Há muitos anos, várias outras grandes fundações, como a Ford e a Rockefeller, endossaram e financiaram iniciativas para solucionar a escassez de vagas.
Entidades filantrópicas que trabalham com desenvolvimento global devem estender esse foco na criação de empregos dos Estados Unidos para seus portfólios de países em desenvolvimento. Novamente, há exemplos para aprender e imitar. A Big Win Philanthropy custeou iniciativas de criação de empregos para jovens em países como a Etiópia e a Costa do Marfim. No passado, financiadores como a Fundação Rockefeller buscaram implantar programas de criação de empregos em setores promissores como a terceirização de processos de negócios. Isso faz sentido para nós; a Growth Teams, fundada por dois de nós, atuou para facilitar o desenvolvimento de um setor de terceirização que criará milhares de bons empregos em Ruanda.
Embora não haja uma resposta fácil sobre como criar mais empregos nos países em desenvolvimento, vários exemplos ilustram o que o progresso nessa área pode fazer pelos países como um todo. O governo de Singapura, sob o comando de Lee Kuan Yew, por exemplo, estabeleceu a construção de uma economia moderna, atraindo a produção estrangeira com uso intensivo de mão de obra, que criaria primeiro empregos de baixa qualificação, depois mudando para uma produção com uso mais intensivo de habilidades e, por fim, desempenhando um papel de liderança na economia global do conhecimento. Em todos os estágios, a capacidade de colocar a educação a serviço do crescimento econômico, combinando a oferta e a demanda de habilidades, foi fundamental para o sucesso da transformação econômica do país.
A Costa Rica oferece outro exemplo instrutivo. Ao visar o investimento estrangeiro direto em serviços, o país conseguiu impulsionar o crescimento de partes importantes de sua economia, a fim de aumentar a produtividade da mão de obra e criar novas oportunidades para a população. A geração de vagas ocorreu não só por meio das corporações multinacionais que se instalaram no país, mas também por meio de fornecedores locais que cresceram por terem se conectado a cadeias globais de valor.
O combate ao desemprego juvenil requer uma abordagem equilibrada que reconheça a interação entre oferta e demanda no mercado de trabalho. Todos esses exemplos ressaltam a importância da criação de empregos para enfrentar esse desafio. Embora as intervenções do lado da oferta, concentradas no desenvolvimento de habilidades, sejam fundamentais, elas devem ser complementadas por iniciativas do lado da demanda, apoiando a criação de postos que possam utilizar de forma produtiva essas habilidades.
Governos, agências de fomento e filantropos devem buscar um equilíbrio mais equilibrado entre as intervenções do lado da oferta e do lado da demanda. Ao fazer isso, eles possibilitarão soluções mais abrangentes e sustentáveis para o desemprego juvenil, capacitando assim os jovens trabalhadores e promovendo a prosperidade econômica para as gerações futuras.